O DIA DO PAI
Não faz muito, há pouco mais de dois anos, ele perdeu o pai. Perdeu um esteio de poucas frases, ombro que aconselhava mais como exemplo e espelho do que com palavras, alguém em quem era possível mirar os silêncios. Ficaram com ele os consolos bons da companheira, da filhota ainda menina da companheira, da mãe em meio às suas próprias feridas, do irmão meio sem jeito.
Mas e o pai, pensou ele. E agora?
O Dia dos Pais, no ano passado, foi de festa vazia. Lembranças e tristeza muda, nó na garganta sem dizer. Cada um para o seu lado, em pequenos disfarces. Faltando alguém necessário na ponta da mesa, alguém que temperasse a melhor carne para o churrasco.
Dia dos Pais para quê, perguntou-se ele. O peito meio oco. Para quê, este dia? Feliz dia dos pais – qual o sentido deste desejo?
E tempos depois sua companheira engravidou. Ele, que ainda não era pai e não sabia se saberia ser, encheu-se de volteios e rapapés e nem percebeu que sua vida já estava mudada. Aquele nervosismo bom e sem nome, que se renovava a cada nova ida ao médico, a cada centímetro vislumbrado na ecografia. Quando atravessou a rua e cuidou-se ainda um pouquinho mais, não se deu conta de que o cuidado extra não era em seu nome, mas sim em nome do bebê vindouro. Em nome da criança ainda sem nome.
Mas que, quando nasceu, levou o nome de João.
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Hoje ele batiza o seu filho. (Na igreja, não há como não pensar em Santa Maria – no Brasil inteiro, não há como não pensar.) Mas enquanto o padre diz o que tem que ser dito sem que ele preste maior atenção, olha este menino nos braços felizes da mãe, estes cabelinhos bastos no coquinho ainda tão frágil, este pequeno que renovou a alegria da casa, este garoto que o enche de sorrisos mesmo quando está sério, esta criança que mudou a sua vida para melhor – e ali está a resposta para a sua pergunta.
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