NO ELEVADOR

Entro no elevador, a velhinha me olha e interrompe a animada conversa que mantinha com sua amiga.

“O senhor é o filho do Pedro Augusto, não é?” – (o respeito solene dos mais velhos, sempre dando senhoria aos demais, mesmo aos mais jovens.)

Sim, respondo. E o olhar da senhora parece se enternecer:

“É a cara dele. Muito parecido...”

Eu sorrio, com saudade. Meu pai morreu há poucos anos e ninguém se acostuma verdadeiramente a isso. E parece que toda a cidade o conhecia; o tempo inteiro, alguém me pergunta por ele.

“Eu conhecia o Pedro Augusto.” - (sim, toda a cidade o conhecia). – “Aliás, fui colega dele na escola.”

“Olha só!...” – digo eu, e sorrio – as memórias da senhora devem ter mais de sessenta anos.

“Nossa, o seu pai não parava quieto! Sempre inventando alguma coisa, conversando com todo mundo! Um azougue, ele!”

Sigo sorrindo, não é preciso dizer nada – aquele de quem a senhora fala era realmente o meu pai. Sempre buscando coisas novas, inventando novidades, envolvendo todo mundo em seus bons projetos. As pessoas gostavam dele por isso, penso.

“Depois, cada um foi pro seu caminho...” – diz a senhora – “Mas eu me lembro dele sempre deste jeito, muito ativo...”

"É, o pai sempre foi assim...” – concordo, enquanto a porta do elevador se abre.

A velhinha e a amiga saem, deixando-me sozinho no elevador, um pouco enlevado com estas renascidas lembranças. Presto atenção à memória de meu pai naquele momento, não à senhora que se afasta – a senhora que, com duas frases, trouxe meu pai um pouquinho de volta.

Mas ainda assim a escuto dizendo à amiga:

“Este Pedro Augusto, sabe? Na verdade, ele era um chato...”


Outros Contos


ROUBADA

AINDA GILDA

OS DIAS LONGOS

NÓS PRECISAMOS CONVERSAR

NO CAFÉ

TIA ESTER

CENA URBANA

AS PERGUNTAS QUE NÃO SÃO FEITAS

CIDADANIA

O CONTO AO VIVO

ANDANDO NA CHUVA

PÁSCOA

UM MENDIGO PARADO NO MEIO DA CALÇADA

RESPEITO

AS TEIMOSIAS

TELEFONEMA PREMIADO

EDUARDO, QUE ESPALHA ESTRELAS

O GURI DALTÔNICO CHEGA AO CÉU

O CINEMA

EMÍLIA AO TELEFONE

 

 

 
 

 


Prêmio que agraciou Henrique Schneider é um dos principais concursos do Brasil


Entrevista: o processo de criação de Setenta


Henrique Schneider palestra no Festival Literário dos Campos Gerais