A VIDA PASSA AO LADO
Adelírio está sentado no banco da praça, olhando o vazio e sem prestar atenção em nada, apenas pensando que nada de bonito acontece em sua vida.
De repente, um cachorrinho viralata se aproxima e estaca próximo ao banco em que Adelírio está sentado. O cão olha para ele com aquela mistura de temor e vontade, vontade de brincar e medo de levar um pontapé, sacudindo a cauda como se estivesse avisando que está ali.
Adelírio não enxerga.
Então é a vez de aproximar-se um molequinho, e a atenção do cachorro volta-se para o recém chegado. Crianças ambos, os dois começam a brincar com intensidade tanta, tanta, que é como se conhecessem há anos – mais anos do que verdadeiramente têm. O menino dá gargalhadas, o cachorro lança ao ar uns latidinhos finos e felizes, enquanto correm sem destino ao redor do banco de Adelírio.
Adelírio não escuta.
Uns minutinhos depois, chega ali uma mulher muito bonita; é a mãe do garoto. Arfando sua felicidade nova, o garoto pede para brincar mais um pouco – na verdade, queria mesmo era ficar com o cachorrinho – e então a mãe senta-se no banco, paciência materna, para esperar. Senta-se ao lado de Adelírio, próxima a ele, e se o homem se permitisse alguma atenção, perceberia o cheiro bom de alfazema que emana da mulher.
Mas Adelírio não sente este aroma.
Depois de um tempo, a mãe olha o relógio e decide que agora é a hora de ir embora. O filho protesta um pouquinho, apenas por reclamar (conhece bem a mãe), mas amolece quando ela diz que amanhã estarão de volta. Então põem-se os dois em seu caminho de casa, e o cãozinho põe-se a segui-los com suas patas curtas. Enquanto o menino pensa numa maneira de manter consigo o novo amigo, os três levam seus passos num alarido bom e cheio de vida.
Adelírio não percebe.
Afinal, ele está muito ocupado, sentado no banco da praça, olhando e vazio e sem prestar atenção em nada, apenas pensando que nada de bonito acontece em sua vida.
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