OSWALDO, QUE ESPERA O FIM DO MUNDO

O crédulo Oswaldo resolveu tomar providências quando soube da notícia que o mundo iria acabar: pagou a conta atrasada da luz, telefonou para alguns poucos amigos apenas para jurar-lhes amizade eterna (os amigos não entenderam nada), mandou rosas para Eneida com um cartão assinado em que declarava o seu amor (ela também não entendeu, mas gostou da ideia), comprou um pijama novo e bem bonito: queria estar bem tranchã quando o fim do mundo chegasse. Afinal, quem sabe o que encontraria depois?...

Na noite em que o mundo estava para acabar, Oswaldo tomou banho, escovou os dentes e se penteou direitinho. Depois, vestiu o pijama novo, colocou o copo de água sobre o criado-mudo e dormiu o sono tranquilo de quem apenas espera o fim do mundo sem dever nada a ninguém.

Quando acordou, no dia seguinte, o mundo acabado parecia bastante igual ao mundo não acabado. Olhou para um lado e para o outro e as coisas todas pareciam também iguais ao mundo em que vivera até o dia anterior: a cama e os cobertores, a televisão desligada, um par de livros no chão, um copo igual ao que havia colocado no criado-mudo na noite anterior, o próprio criado-mudo.

Oswaldo, o crédulo, desconfiou: tudo hoje tão igual a ontem! Será que o mundo teria mesmo acabado?

Resolveu ligar a televisão (igualzinha a que tinha no mundo de ontem), para ver se as notícias lhe davam uma pista maior.

No noticiário, um filho havia matado a mãe a facadas, sete guerras haviam começado, as chacinas em presídios deixavam cabeças penduradas em postes, um país qualquer inventava uma nova bomba, turbas linchavam nas ruas, as aposentadorias só valiam para quem tivesse mais de cem anos, o rompimento de uma barragem deixava coberta de lama a história e a vida de toda uma região, um atentado matava trinta e cinco no restaurante de uma praia, homens violentavam mulheres porque achavam que elas lhes pertenciam, barcos lotados de imigrantes afundavam no oceano, os poderosos falavam em construir muros em vez de derrubá-los.

O crédulo Oswaldo desligou a televisão e respirou aliviado. Afinal, não era engano: o fim do mundo parecia estar mesmo aí.


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