AMIGOS IMAGINÁRIOS
Almoçamos junto em um restaurante, às vezes tomamos um café; em raras ocasiões acertamos as agendas para o cinema ou happy hour, sempre curta – daí a pouco já estamos cada qual em sua casa. Não mais do que isso, há anos, mas estes encontros quase regulares acabaram criando, entre eu e ela, uma amizade cheia de bons segredos e silêncios. Nunca fui à casa de minha amiga, nem ela foi à minha: melhor talvez seja apenas imaginar as pequenas intimidades, a plantinha na área de serviço, o livro à cabeceira, o tipo de almofadas sobre o sofá, o canal em que a televisão está ligada. E mais: nem conhecemos os amigos e amigas um do outro. Ela me fala de alguns e eu faço o mesmo sobre os meus, mas são turmas diferentes, que nunca se encontram e talvez tenham pouco a se dizer quando se encontrarem. Porque a amizade é entre eu e ela - simples. E sabemos bem um do outro: há tantos anos conversando sobre os filmes que vemos, os romances sendo lidos, as pessoas com quem saímos, a psicologia dos cafés, a filosofia dos bares, algumas paixões comuns, a vida.
Bons amigos, ela e eu. Talvez um pouco solitários.
E então hoje.
De repente ela me contou, enquanto almoçávamos num restaurante que eu havia sugerido, que há anos tinha alguns amigos imaginários. O quê? - eu perguntei. Amigos imaginários, ela repetiu. Amigos com quem converso quando estou sozinha, completou.
Eu dei uma gargalhada tão alta que as pessoas das mesas próximas se voltaram para ver o que acontecia. Ela enrubesceu e deu às pessoas um breve olhar que parecia pedir desculpas.
“Amigos imaginários! Tu? Que bobagem!” – disse eu, enquanto continuava a rir.
Ela não riu. Permaneceu séria, como se estivesse prestes a dizer algo importante.
“Mas eles existem!” – explicou, tentando a serenidade que minha risada não deixava – “Tu, por exemplo, és um deles...”
Então eu ri ainda mais alto, uma gargalhada que não conseguia parar – e o olhar dela para mim era de um desapontamento profundo, de uma amizade que de repente se terminava. Eu ria, ria, o riso era mais forte do que eu, incontido, enquanto ela seguia em seu silêncio sério.
E eu só fazia gargalhar daquela grande bobagem.
Mas quando olhei para as minhas mãos e percebi que elas começavam a desaparecer, parei de rir.
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