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O ABRAÇO, AI, O ABRAÇO
Estão marido e mulher tomando o café da manhã, como fazem há anos. A novidade é o silêncio que, há algum tempo, substituiu as conversas companheiras que antes ambos tinham tão facilmente. Há poucas falas e elas duram apenas o tempo suficiente à necessidade do dizer, nada além. Ele agora lê o jornal, talvez esteja sozinho. Ela come sem palavras uma fatia de bolo de laranja; tem o olhar triste.
De repente, a mulher olha para cima (não, não olha para o marido), suspira e nem percebe quando exclama:
“Vontade de um abraço!...”
“Ahan.” – o marido responde, sem tirar os olhos do jornal.
“Vontade de um abraço!...” – ela repete, um pouco mais alto.
“Ahan.” – ele repete – (mas as pesquisas eleitorais, a queda do dólar, os números da bolsa, o resultado do jogo).
Ela agora encara o marido e uma tristeza de tanto tempo de repente lhe enche os olhos.
“Vontade de um abraço!” – ela grita, quase com violência (quer um abraço, será que o marido não percebe?)
“Ahan!” – ele grita, quase com violência (quer ler o jornal, será que a mulher não percebe?)
Ela então levanta de sua cadeira, larga pela metade a fatia de bolo e salta em direção ao assento do marido. Tenta abraçá-lo com certa sofreguidão atrapalhada, força dos anos antigos, mas a intensidade do gesto parece assustar o homem. Ele não devolve o abraço no primeiro instante; é só depois de uns segundos que o aceita, um pouco tenso.
Quando a mulher termina, está em lágrimas. Fosse em outros tempos, não estaria. Fosse em outros tempos, se estivesse em lágrimas, não ficaria com vergonha. Mas agora, tristeza redobrada e sem abraços, está envergonhada. Vergonha do marido, do gesto, deste carinho.
Então corre para o quarto, para recompor-se – e chorar um pouco sozinha.
Ele segue na mesa do café, atônito por uns instantes.
“Vai entender esta minha mulher”, pensa.
E volta à leitura do jornal.
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