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UM CARRAU AUTÊNTICO
No antiquário, em meio a um monte de velharias maravilhosas e quinquilharias interessantes, o quadrinho a óleo me chama a atenção. Não especificamente pela beleza – embora se possa perceber nele traços de certo talento -, mas sim pelo fato evidente de que foi pintado por uma criança: as pinceladas, o tema, a ausência de detalhes adultos, tudo indica que o quadro, já bem antigo, foi pintado por algum moleque de seus nove, dez anos. Pego-o, mais por curiosidade do que qualquer outro motivo – se for bem baratinho, talvez eu o compre. Pelo inusitado.
O proprietário, um sujeito velhusco e que se parece com alguns dos objetos à venda, aponta para o quadro e sorri:
´É autêntico.”
Claro que é, penso – nenhuma possibilidade de cópia ou falsificação de um quadro de criança.
“Mas não é apenas autêntico. É um Carrau autêntico! Um Carrau da primeira fase” – e ele diz isso com uma espécie de admiração controlada, enquanto me mostra a assinatura no canto inferior direito da tela.
Está lá, o nome, bem legível. Opa, penso. Já não é mais apenas um quadro de criança: já tem assinatura e grife. Pergunto o preço e ele me informa: é, no mínimo, dez vezes mais do que eu imaginava.
“Mas é um Carrau autêntico!” – ele repete, como a me dizer que o quadro valerá cada centavo investido. Ou muito além disso – é o que seu olhos dizem.
Observo o quadro com nova atenção: não mais a simples curiosidade de ter nas mãos o quadrinho bonito pintado por uma criança, mas sim uma obra da primeira fase de um verdadeiro pintor. Já é outro o meu olhar.
“Uma oportunidade única!” – me assevera o antiquário.
Olho outra vez a pintura, e agora me parece que nela há mesmo traços de gênio, a pincelada precoce de um grande nome. Penso no valor que o homem me informou: o preço é salgado, mas o investimento deve valer a pena. Afinal, é um Carrau autêntico.
Decido comprar o quadro e peço ao dono do estabelecimento que o embale com cuidado. Então, saio do antiquário contendo em meus braços a minha nova jóia. O meu Carrau autêntico, com assinatura e tudo.
Vou direto para casa, para que nada aconteça à pintura. E também para pesquisar, nos livros e na internet, quem é este tal de Carrau, de quem nunca ouvi falar.
Outros Contos
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